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Ódio registrado na rede gera risco de violência fora dela



Chico Buarque, 67, não conhecia os confins da internet. Recentemente, em vídeo publicado na rede, o compositor contou como essa relação começou: leu os comentários de uma notícia relacionada a ele em um grande portal.

"Hoje em dia, com essa coisa de internet, as pessoas falam o que vem à cabeça", diz. "Se o artista olhar na internet, ele é odiado." O vídeo, curiosamente, não está aberto para comentários.



O que Chico Buarque descobriu é o cotidiano da rede: com a facilidade de serem anônimos e a sensação de fazerem parte de um grande grupo, usuários destilam seu ódio em fóruns, portais e redes sociais - são os "haters" (odientos).



O excesso de raiva pode ter consequências drásticas: recentemente, o jornalista Geneton Moraes Neto moveu uma ação na Justiça contra um usuário do Twitter que o acusou de plágio. Venceu, e o réu foi condenado.



A desindividuação, fenômeno psicológico estudado desde o fim do século 19, tem sido cada vez mais discutida. Psicólogos associam o ódio on-line à falta de estrutura familiar e afirmam que a internet escancarou as portas para o bullying.

Sites e governos buscam soluções para coibir o anonimato na rede.



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Nesta edição, conheça a opinião de "haters", de psicólogos e de pessoas que lidam com o ódio virtual diariamente - Os moderadores de fóruns e comunidades.



Menina de 11 anos chegou a receber ameaças de morte depois de ter publicado vídeo polêmico na internet

Moderadores lamentam anonimato; leitores de sites de notícias usam a internet para mostrar sua indignação



Aos 11 anos, Jessica Leonhardt - conhecida no YouTube como Jessi Slaughter - buscava fama na internet. "Topo qualquer tipo de fama", disse ela em um de seus vídeos. A situação saiu do controle.



Jessica fez um vídeo recheado de palavrões e disse que as pessoas que falavam mal dela tinham apenas ciúmes, já que ela era "perfeita".



A garota e sua família receberam ameaças de morte, foram vítimas de pegadinhas por telefone, e a escola onde ela estudava recebeu um pacote que foi tomado como suspeita de bomba - não era nada, segundo o site Smoking Gun, que diz ter obtido os documentos policiais relacionados ao caso.



Jessica foi colocada sob proteção da polícia e, em seguida, enviada para uma clínica para tratar sua saúde mental - constatou-se que a garota tinha tendências suicidas.

O caso de Jessica deixou em evidência um ato recorrente na internet: o despejo de ódio e indignação.



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Jessi Slaghter - Jessica Leonhardt fez um video xingando as pessoas que falavam mal dela. Teve de ser colocada sob proteção da polícia.



Batalha Perdida



A.A.S., moderador de comentários de um grande portal, que prefere não divulgar seu nome, considera o anonimato dos internautas um perigo. "Eles têm a 'segurança' de falar o que bem entendem sem sofrer nenhum tipo de retaliação", diz.



Mesmo os usuários identificados causam trabalho. "Já recebemos ameaças de mensagem para a presidência da empresa por termos deletado um comentário."

Para ele, há grande relação entre o "hater" e o usuário considerado "fanboy", apelido dado aos fãs de determinada marca que se esforçam para defendê-la e detratar as concorrentes.



Em tom melancólico, ele aponta que a batalha contra os "haters" que se escondem no anonimato está perdida. "Qualquer um pode criar um perfil falso. Tentar ter controle sobre isso não é fácil. É preciso mais investimento humano para fazer esse monitoramento", lamenta ele.



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Moderador de comunidades sofre para controlar 'haters'



Nada a Esconder



Há também quem demonstre a indignação pela internet sem medo de revelar a identidade real. Em sites noticiosos, os comentaristas mais assíduos costumam ter um assunto preferido: política.



Um deles é o agente de viagens Ricado Kaffa, 46. Apesar do uso frequente de várias exclamações em sequência e de letras maiúsculas em seus comentários, ele ressalta que não usa o espaço só para expressar revolta. "Não é só indignação. Tem alegria também", afirma.



Kaffa conta que os comentários não agradam a algumas pessoas. "Vivem me denunciando, e mal uso palavras ofensivas." Apesar de comentar muito, ele é cético em relação ao impacto disso. "Não vou mudar o mundo com meus comentários."

O aposentado Antonio Carlos Wanderley, 60 anos, diz que comenta em vários jornais e blogs. Seu assunto preferido também é política. "Antes de começar a usar a internet, cheguei a comprar um fax para enviar opiniões a jornais e demonstrar minha indignação", diz.



Ele garante que a distância física não faz com que ele se sinta mais livre para dizer as suas opiniões. "Talvez eu consiga me expressar melhor escrevendo, mas fico à vontade de qualquer forma quando defendo um ponto de vista."



Suposto anonimato estimula mostras de repúdio, diz psicóloga



O suposto anonimato proporcionado pela internet dá uma falsa sensação de segurança aos usuários, que aproveitam isso para despejar o ódio que sentem.

"Em um espaço onde, teoricamente, ninguém descobre quem você é, você se sente mais seguro para falar o que pensa e colocar para fora o que julga que a sociedade não aceita", afirma a psicóloga Luciana Ruffo, do Núcleo de Pesquisa da Psicologia em Informática da PUC de São Paulo.



Além disso, diz ela, a web tornou mais fácil o encontro de grupos de pessoas com gostos em comum. "Da mesma forma que isso serve para coisas legais, serve para coisas não tão boas assim, como é o caso dos 'haters'", diz.



Existem também pessoas que disseminam ódio nas páginas da internet como forma de experimentação, afirma Luciana. Segundo ela, normalmente são pessoas mais novas, que querem saber como é viver algo assim.



Na maioria das vezes, o ódio vem de um grupo específico de pessoas, diz a psicóloga, que enxerga padrões entre os "haters". "São pessoas que vêm de uma família que não teve a estrutura adequada para criar indivíduos saudáveis. Elas foram, de certa forma, criadas para ser assim", afirma.



No caso do ciberbullying - quando os meios digitais, como a internet, são usados para atingir as pessoas de uma maneira ruim -, ela diz que os agressores geralmente vêm de "lugares onde, de alguma forma, existem violência, raiva, ódio".



"São pessoas que têm pais que impuseram poucos limites e geraram estruturas pobres de regras."



O ciberbullying também trouxe mais mulheres para o grupo dos agressores, segundo ela. "Isso ocorre porque o ciberbullying não exige força física. Ele funciona por outros meios", afirma.

Problemas de personalidade estão entre as consequências para as pessoas que sofrem com o bullying na internet, diz Luciana.



Uso do Facebook para comentários afugenta 'trolls'



Para afugentar "trolls" (visitantes que visam criar polêmica) e gerar debates ricos, muitos sites tentam melhorar seus sistemas de comentários. Uma alternativa que tem se popularizado é o Coments Box, do Facebook.



Ele permite que leitores usem sua conta na rede social para publicar comentários nas páginas que visiteam. Com isso, os sites ganham exposição no Facebook e exorcizam "trolls", pois muitos deles agem só no anonimato.



O TechCrunch sentiu a mudança logo nos primeiros dias - a quantidade de comentários diminuiu muito, mas a qualidade subiu, diz um artigo no blog. "É surpreendente quão rápido os 'trolls' sumiram quando a identidade real começou a ser imposta."



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Seção de comentários do TechCrunch (techcrunch.com), que usa sistema do Facebook



Fonte: Caderno Tec, do jornal Folha de São Paulo, edição de 10 de agosto de 2011.


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